quarta-feira, abril 20, 2005

Está provado: o Papa é pop

o pop não poupa ninguém

Tenho amigos cristãos, ateus, budistas, indecisos. Minha mãe é devota de Santo Expedito e a maior parte dos meus tios e primos se casou na igreja católica. Tenho o maior respeito por todas as formas de religião e esta é a base da minha convivência com essas pessoas, com quem nunca tive desentendimentos em questões religiosas. Respeitar inclui não julgar as pessoas pelas opções espirituais que fazem. Cada um escolhe seguir uma religião - ou não seguir nenhuma delas - com base nas suas necessidades emocionais, e não nos cabe dizer que esta crença é errada e aquela outra, a certa. Cada um de nós, dentro de si, conhece a verdade - a sua verdade particular. Contudo...

Perdoe-me, Pai, mas a doutrina católica vai contra tudo em que acredito.
Gostaria de usar declarações do novo pontífice como exemplo. Que muita gente não foi com a cara dele é verdade, mas muitas das coisas que ele disse, motivo de reação indignada por parte de gays e vítimas de abusos de padres pedófilos, entre outras minorias, não são novidade na Igreja Católica.

Joseph Ratzinger, ou Bento XVI, afirma que a inclinação homossexual não é um pecado, mas uma "tendência que vem de um mal moral intrínseco". Coloca-se contra a união legal de pessoas do mesmo sexo, que considera como "destrutiva para a família e para a sociedade". Isso quer dizer que os homossexuais deveriam controlar seus impulsos e restringirem-se a relações carnais e amorosas (dentro do casamento, é claro!) apenas com pessoas do sexo oposto, quando seu prazer e sua felicidade dependem de outras práticas? O sujeito gay se esconde, casa-se com uma boa moça, tem filhos e uma fachada respeitável, mas sempre que pode dá uma escapada com garotos de programa. Será que isso é melhor do que sair do armário e poder escolher o amor da sua vida, se é isso que ele procura, entre pessoas do seu próprio sexo? Todo mundo já viu esse filme.

Entre outras pérolas o pontífice afirmou que "os judeus são ligados a Deus de uma maneira especial", mas que aguarda "o momento em que Israel vai dizer 'sim' a Cristo". Primeiro ele louva a religião de Davi, depois expõe o que considera como sua imperfeição, que é o fato de não aceitar Jesus como o Messias. E daí se o povo judeu acha que o Messias ainda está por vir? Não basta reconhecermos o óbvio mérito da causa de Jesus, que pretendia apenas trazer paz ao seu povo?

Bento XVI não gosta de rock, que considera como um "veículo anti-religião". Será que ele nunca ouviu falar em bandas gospel? Tem mais, tem mais. Definiu o aborto e a eutanásia como "claro pecado grave". Mas nem vou dizer qual é a minha posição com relação a isso porque geraria mais dois textos bem longos que não estou a fim de escrever.

Pra quem estiver curioso pra saber se onde saíram essas citações e ter acesso a um pouco mais, não é segredo:

http://noticias.terra.com.br/mundo/novopapa/interna/0,,OI517260-EI4832,00.html

Cuidado com o link quebrado, tá?

A Igreja Católica, e não especificamente o novo papa, opõe-se à ordenação de mulheres. Podemos ser freiras, mas jamais bispas, cardealesas ou papisas. Também não posso concordar com isso, em plena era da mulher de carreira. Se somos capazes de conciliar estudo, marido, filhos, sexo, carreira, romance, por que não poderíamos também encabeçar religiões? O que me soa estranho é que as mulheres católicas concordem. Se não concordarem, não são católicas, ora essa. Se você quer aceitar a doutrina, tem de fazê-lo por inteiro e não apenas em parte. Sem hipocrisia.

Viva a pílula anti-concepcional, gente! Viva o preservativo, o diafragma, a camisinha feminina e até a vasectomia. Com ela não precisamos apressar matrimônios mal-planejados só para poder consumar nosso desejo pela pessoa amada. E não precisamos esperar a pessoa amada aparecer nas nossas vidas para termos sexo, que é um impulso perfeitamente natural e saudável. Por favor, deixem-me ter autonomia sobre meu corpo! Eu não sou uma costela!

Não me entendam mal. Se há um Deus, juro por ele que nada tenho contra os católicos. Eu amo minha família! Amo meus amigos também, e não acho que nenhum deles seja um iludido apenas por acreditar em coisas em que eu não acredito. Só o que acho é que falta espírito questionador a muita gente. Como é? Vamos deixar isso para os jornalistas? Questionar não é profissão, gente, é usar a cabeça pra melhorar a própria vida, é perguntar como podemos acertar o que nos parece errado. Não engulam o santo remédio sem ler o rótulo. Não se deformem, informem-se. Mais do que católicos, espíritas, ateus, harekrishnas ou judeus, sejam vocês mesmos, vivam de forma a ter a consciência limpa e o coração leve, e não como disse um cara do outro lado do mundo, com quem vocês nunca falaram pessoalmente e cuja índole desconhecem.

Confiem em si mesmos.

Em tempo: AMO arte sacra e a maior responsável por seu desenvolvimento é, claro, a Igreja, que soube selecionar ao longo dos séculos artistas de talento para decorar suas belíssimas capelas. Mas acho de extremo mau-gosto cultuar a figura de Jesus, esse cara tão gente boa, como um moribundo pregado numa cruz, magro, humilhado, sangrando, sofrendo o diabo. Por que não guardar a imagem do Cristo como um homem de alma lúcida, ensinando seus ideiais aos fiéis? Ou Jesus menino, tão cheio de ternura e amor em seu bercinho de palha? A crucificação é um negócio sangrento! Cena de filme de terror, apavorante mesmo. Fala sério... "Ele morreu para nos salvar"? Como basear sua vida religiosa num complexo de culpa?

Podem apostar que Deus não tem nada a ver com isso.

Do fundo do coração, peço desculpas se este texto ofende as suscetibilidades de alguém, pois essa não foi minha intenção ao escrevê-lo. Lamento por isso. Mas lamento sobretudo por aqueles que não entendem que pecado é ficar calado.

Agradeço pelo link noticioso e, por assim dizer, pela inspiração ao amigo Alexandre Heredia, o cara dos Antelóquios.


 

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